DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO
Agora é o momento de analisarmos os aspectos processuais que você precisa dominar para
defender os interesses do seu cliente.
1. PEÇA PROCESSUAL – IRRECORRIBILIDADE IMEDIATA DAS DECISÕES
INTERLOCUTÓRIASO art. 230 do Código de Processo Civil, que se aplica de forma subsidiária e supletiva ao Direito
Processual do Trabalho, define as decisões interlocutórias como atos do juiz que não ponham fim ao
processo judicial nem extinguem a execução.
Na esfera trabalhista, vigora o Princípio da Irrecorribilidade Imediata das Decisões Interlocutórias,
estabelecido no art. 893, §1º, da CLT, segundo o qual a parte somente pode se insurgir contra a
decisão no momento recursal, após a prolação da sentença.
Todavia, a jurisprudência trabalhista alberga exceções, como se pode constatar pela leitura da
Súmula nº 214 do Tribunal Superior do Trabalho. Entretanto, o que é relevante para o caso proposto
é a identificação da medida judicial que pode ser adotada com o intuito de reverter a decisão que
deferiu a prova digital. Para tanto, é essencial a detida análise da Súmula nº 414, do TST, em
particular seu item II, que assim dispõe:
Nº 414 TST
SÚMULA Nº 414 – MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA (OU
LIMINAR) CONCEDIDA ANTES OU NA SENTENÇA
I – A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela
via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A
ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso.
II – No caso da tutela antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença,
cabe a impetração do mandado de segurança, em face da inexistência de
recurso próprio.
III – A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do
mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar)
O remédio processual está previsto, portanto, na Lei nº 12.016/2009, que deve ser cuidadosamente
analisada.
Para se valer desta ação mandamental, é necessária a comprovação, de plano, de que o fato em
discussão viola direito da parte. Além disso, a decisão objeto de irresignação não pode ser passível
de reforma por meio de recurso imediato, como ocorre no caso sob exame. Você, portanto, tem que
demonstrar a
violação a direito líquido e certo do trabalhador, que poderá ser comprovada sem a
necessidade de dilação probatória. Para tanto, demonstrar que a ordem jurídica pátria foi violada
pela decisão judicial proferida pelo juízo da 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG.
No tocante às partes, em sede de mandado de segurança, o autor é denominado impetrante,
enquanto aquele que pratica o ato impugnado ou impugnável denomina-se autoridade coatora. Notese que, embora não se confunda com recurso, tem-se entendido possível o manejo desse expediente
para atacar ato praticado no curso do processo judicial, quando a decisão judicial (ato) por si
ocasionar a lesão ao direito líquido e certo do interessado.
Tendo em vista que o ato coator foi proferido pelo juízo da 48ª Vara do Trabalho de Belo
Horizonte/MG, ele deve figurar no polo passivo, como impetrado. Trata-se de típica situação de
litisconsórcio passivo necessário (arts. 113 e 114 do CPC), de forma que a reclamada também deve
figurar como impetrada, haja vista que a decisão a ser proferida em decorrência da peça processual
a ser elaborada atingirá sua esfera de interesses, pois a pretensão almejada é a revogação da
decisão que deferiu a quebra do sigilo de geolocalização do reclamante.
A petição inicial da ação mandamental deverá observar, basicamente, os mesmos requisitos da
reclamação trabalhista. No caso, deverá ser endereçada para o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª
Região, que é hierarquicamente superior à autoridade coatora e, portanto, o órgão competente para
eventual revisão da decisão interlocutória proferida na reclamação trabalhista.
Ao despachar a petição inicial, o TRT notificará a autoridade coatora do conteúdo da peça processual
para que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações nos autos. Não se trata, portanto, de
contestação a ser apresentada pela 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, mas meras
informações acerca da decisão judicial proferida. Por esta razão, ocorre sua notificação, e não sua
citação.
Em resumo, de forma bastante direta e didática, a ação a ser elaborada, na prática, faz as vezes de
um recurso.
Importante ressaltar que o art. 7º da Lei nº 12.016/09, em seu inciso III e §1º, autoriza o requerimento
de medida liminar na petição inicial, com o objetivo de suspender os efeitos do ato impugnado
(decisão que deferiu a produção de prova digital) até o julgamento da ação mandamental. Então,
valha-se desta possibilidade, eis que é fundamental para resguardar os direitos do seu cliente.
Portanto, lembre-se de que, para que a liminar seja concedida, faz-se imperioso restar demonstrado
os seguintes requisitos: probabilidade do direito e perigo da demora. Sendo assim, é necessário que
você demonstre o risco de manutenção da decisão até o julgamento final desta ação, isto é, os
prejuízos que seu cliente pode ter com esta espera, bem como o perigo da demora caso a decisão
na ação mandamental seja inócua, haja vista o transcurso regular da reclamação trabalhista
contendo as provas digitais requeridas e autorizadas pelo juízo.
A peça processual também tem rol de pedidos e deve ser indicado o valor da causa. Não se esqueça
de inserir data e assinatura sem sua identificação.
Lembre-se de que o prazo de ajuizamento é de 120 (cento e vinte) dias, conforme art. 23 da Lei nº
12.016/09, mas que você deve ser muito ágil, haja vista os direitos do seu cliente que estão em
“jogo”, pois, no máximo, em 30 (trinta) dias, os dados de geolocalização do laborista terão sido
juntados aos autos pela companhia telefônica.
2. DIREITO MATERIALO cerne da questão, do ponto de vista do Direito Material, é se a quebra do sigilo de geolocalização
do reclamante João da Silva viola ou não alguns de seus direitos.
O ponto de partida deve ser a análise das disposições da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988. O seu art. 5º, inciso X, dispõe sobre o direito à intimidade, ao passo que o inciso XII
preceitua sobre a inviolabilidade das comunicações.
Outras fontes normativas também podem ser úteis para o desenvolvimento da peça processual a ser
elaborada. Sugere-se a leitura da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei nº 13.709/18), em
especial, seus arts. 1º e 2º, e do denominado Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14), em particular,
o seu art. 7º.
Em se tratando de jurisdição trabalhista, é interessante analisar o Enunciado nº 27, do Grupos de
Estudos Análise Normativa e Análise Jurisprudencial da Escola Judicial do Tribunal Regional do
Trabalho da 4ª Região, que assim sugere:
Enunciado nº 27 – PROVA DIGITAL POR GEOLOCALIZAÇÃO. VIABILIDADE.
REQUISITOS. INICIATIVA. PRODUÇÃO. ANÁLISE. OPOSIÇÃO. RESGUARDOS.
I – A prova digital por geolocalização é legal, moralmente legítima (art. 369 do CPC)
e está genericamente autorizada nos arts. 22 da Lei 12.695/2014 (MCI) e 7º da Lei
13.709/2019 (LGPD). Em sua produção devem ser observados os requisitos de
autenticidade, integridade e cadeia de custódia (art. 4º, VIII, da Lei 12.527/2011 e
arts. 158-A, 158-B e 159 do CPP).
II – A prova digital por geolocalização pode ser requerida pela parte ou determinada
de ofício pelo(a) juiz(íza) do trabalho (art. 13 Lei 11.419/2006). Na avaliação do
requerimento, será observada a distribuição dinâmica do ônus probatório digital (art.
42, § 2º, da LGPD).
III – A prova digital por localização não é infalível, nem substitutiva da prova
testemunhal. Na decisão de sua produção, cabe à(ao) juiz(íza) do trabalho efetuar
avaliação de verossimilhança. Em sentença, será analisada conjuntamente com
demais meios de prova produzidos.
IV – Somente o titular dos dados pessoais requisitados, que eventualmente se sentir
lesado com a ordem judicial, pode manejar medidas processuais para discutir a
determinação. Cabe unicamente ao controlador dos dados cumprir a ordem judicial
de apresentação das informações (arts. 5º e 7º, § 5º, da Lei 12.965/2014).
V – Cumpre ao(à) juiz(íza) avaliar resguardo de dados sensíveis (art. 194 do CPC; e
arts. 5º, II; 7º e 11 da LGPD), inclusive com imposição de segredo de justiça.
Agora você já tem elementos suficientes para fundamentar a petição inicial de sua ação
mandamental a ser ajuizada com o objetivo de cassar a decisão interlocutória que autorizou a quebra
do sigilo de geolocalização do reclamante
De toda forma, sugiro que você acesse a decisão do Processo nº 0000865-44.2021.508.0000,
proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, e que pode ser acessada no seguinte
endereço eletrônico:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-8/1659553302/inteiro-teor-1659553303
Aconselha-se, ainda, a leitura da decisão prolatada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região,
nos autos nº 0011685-29.2022.5.03.0000, que menciona acerca da excepcionalidade da quebra do
sigilo de geolocalização do trabalhador:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-3/1715640471/inteiro-teor-1715640512
3. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016/09, não é cabível condenação ao pagamento de honorários
advocatícios de sucumbência em ação desta natureza. Assim, não é necessário qualquer tópico
neste sentido.
4. JUSTIÇA GRATUITA
Tendo em vista a situação econômica de João da Silva, já noticiada na Seção 1 do NPJ de Direito
Trabalhista, é recomendável que seja requerida a justiça gratuita, a fim de que não haja o pagamento
de custas, caso a segurança seja denegada.
Quadro 1 | Sinótico da legislação e jurisprudência consolidada aplicável (referidos e não referidos nas
explicações anteriores)

Fonte: elaborado pelo autor.