DAS PROVAS
A audiência de instrução e julgamento é o momento processual adequado para fazer valer os
princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, pois todos os personagens processuais
participam de forma a produzir as provas que serão utilizadas para que seja proferida a sentença.
Tal assertiva é importante para fazer valer o dispositivo previsto no art. 155 do CPP nestes termos:
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em
contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas.
Por isso, imprescindível a prova ser reproduzida em juízo para que possa ser utilizada pelo Poder
Judiciário para a prolação de uma sentença criminal.
No que diz respeito ao interrogatório como meio de prova, menciona-se que o Código de Processo
Penal assinala que o acusado poderá apresentar a sua versão dos fatos ou calar-se, devendo ser
ouvido ao final, em obediência ao princípio constitucional da ampla defesa. Essa é a dicção do Código
de Processo Penal, in verbis:
Art. 186, CPP. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da
acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do
seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem
formuladas.
Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser
interpretado em prejuízo da defesa.
Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado
e sobre os fatos.
§ 1º Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de
vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso
afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação,
qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.
§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre:
I – ser verdadeira a acusação que lhe é feita;
II – não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuíla, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e
quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;
III – onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;
IV – as provas já apuradas;
V – se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando,
e se tem o que alegar contra elas;
VI – se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto
que com esta se relacione e tenha sido apreendido;
VII – todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos
antecedentes e circunstâncias da infração;
VIII – se tem algo mais a alegar em sua defesa.
Art. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do
ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela
defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e
ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e
procedendo-se o debate.
Diante dos dispositivos citados, especialmente o art. 411 do CPP, que regulamenta a audiência de
instrução e julgamento, percebe-se que o interrogatório deve ser feito ao final, em homenagem aos
princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido processo legal.
Por tratar-se de uma imposição constitucional (devido processo legal), a inversão do rito processual
do interrogatório, sendo feito ao início da audiência de instrução e julgamento, gerará uma nulidade,
ferindo de morte a possibilidade de contraditório, bem como espanca a ampla defesa.
Essa é a visão serena na jurisprudência pátria, citando-se, por todos, acórdão do Superior Tribunal
de Justiça:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. DIREITO
PROCESSUAL PENAL. TEMA 1.114. INVERSÃO DA ORDEM NO
INTERROGATÓRIO DO RÉU. ART. 400 DO CPP. NULIDADE QUE SE SUJEITA À
PRECLUSÃO TEMPORAL. ART. 571, INCISO II E ART. 572, AMBOS DO CPP E À
DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO À DEFESA – ART. 563 DO CPP. RECURSO
PARCIALMENTE CONHECIDO E NESTA EXTENSÃO PROVIDO.
I – Em que pese haver entendimento nesta Corte Superior admitindo o interrogatório
quando pendente de cumprimento carta precatória expedida para oitiva de
testemunhas e da vítima, a jurisprudência majoritária nas Cortes superiores vem
evoluindo e se sedimentando no sentido de que há nulidade ocasionada pela
inversão da ordem prevista no art. 400 do CPP, no entanto, a alegação está sujeita
à preclusão e à demonstração do efetivo prejuízo.
II – Os parâmetros em aparente oposição são, portanto, o artigo 222, § 1°, do CPP e
o art. 400 do mesmo diploma legal. Ao que se pode enfeixar a controvérsia, colocase em ponderação os princípios da celeridade processual e do devido processo legal,
especialmente na sua dimensão da ampla defesa.
III – A audiência de instrução e julgamento é o principal ato do processo, momento no
qual se produzirão as provas, sejam elas testemunhais, periciais ou documentais, ao
fim da qual, a decisão será proferida. Por esta razão, o art. 400 determina que a oitiva
da vítima, das testemunhas arroladas pela acusação e depois pela defesa, nesta
ordem, eventuais esclarecimentos de peritos, acareações, ou reconhecimento de
coisas ou pessoas e, por fim, o interrogatório. Tal artigo, introduzido no ordenamento
pela Lei n. 11.719, de 2008, significou a consagração e maximização do devido
processo legal, notadamente na dimensão da ampla defesa e do contraditório, ao
deslocar o interrogatório para o final da instrução probatória.
IV – Na moderna concepção do contraditório, segundo a qual, a defesa deve
influenciar a decisão judicial, somente se mostra possível a referida influência quando
a resposta da defesa se embasar no conhecimento pleno das provas produzidas pela
acusação. Somente assim se pode afirmar a observância ao devido processo legal
na sua face do contraditório
V – Sob outro enfoque, ao réu incumbe arguir a nulidade na própria audiência ou no
primeiro momento oportuno, salvo situação extraordinária em que deverá argumentar
a excepcionalidade no primeiro momento em que tiver conhecimento da inversão da
ordem em questão. Cabe também à defesa a demonstração do prejuízo concreto
sofrido pelo réu, uma vez que se extrai do ordenamento, a regra geral segundo a
qual, as nulidades devem ser apontadas tão logo se tome conhecimento delas, ou no
momento legalmente previsto, sob pena de preclusão, tal como dispõe o art. 572 e
incisos, do CPP.
VI – No caso concreto, observa-se que o primeiro momento em que a defesa apontou
a nulidade pela violação do art. 400 do CPP foi em razões de apelação. Isso porque,
ao que se observa nos autos, não é difícil notar a insuficiência da defesa exercida
por advogado dativo. As nomeações de advogados dativos para o ato de
interrogatório, bem como para a apresentação de defesa prévia e alegações finais
(cujos termos são idênticos, conforme fls. 170/172 e 256/258, respectivamente)
parecem não ter suprido minimamente o direito à defesa enunciado pela Constituição
da República.
VII – Em sendo assim, é possível se reconhecer que, no primeiro momento em que o
réu estava sendo representado por um advogado, foi arguida a nulidade. Esta deve
ser reconhecida, notadamente nesta hipótese em exame, em que a prova é
exclusivamente oral, uma vez que os Laudo de Exame de Conjunção Carnal e de
Exame de Ato Libidinoso não corroboram os fatos e tampouco o Relatório Psicológico
é categórico sobre a veracidade da versão narrada pela vítima. Por tal razão, deve
ser reconhecida a nulidade arguida, determinando-se que o réu seja novamente
ouvido, em atenção ao art. 400, do CPP.
VIII – Tese jurídica: “O interrogatório do réu é o último ato da instrução criminal. A
inversão da ordem prevista no art. 400 do CPP tangencia somente à oitiva das
testemunhas e não ao interrogatório.
O eventual reconhecimento da nulidade se sujeita à preclusão, na forma do art. 571,
I e II, do CPP, e à demonstração do prejuízo para o réu”.
Recurso parcialmente conhecido e nesta extensão provido para reconhecer a
nulidade do interrogatório que, realizado antes da oitiva das testemunhas, violou a
norma do art. 400 do CPP, razão pela qual os autos devem ser devolvidos para a
realização de novo interrogatório. Prejudicados os demais pedidos recursais
relativamente à ausência de prova da autoria delitiva. (REsp 1933759 / PR).
De acordo com essa jurisprudência, a inversão do interrogatório para o início da audiência de
instrução e julgamento gera uma hipótese de nulidade, devendo o ato ser anulado desde o início da
referida audiência, na forma do art. 564, IV, do CPP.
Em relação à prova testemunhal, na forma dos arts. 202 e 203 do CPP, destaca-se que a pessoa
que presenciou os fatos tem o dever legal de dizer a verdade, podendo qualquer um ser considerado
testemunha na forma prescrita na lei:
Art. 202. Toda pessoa poderá ser testemunha
Art. 203. A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade
do que souber e lhe for perguntado, devendo declarar seu nome, sua idade, seu
estado e sua residência, sua profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente,
e em que grau, de alguma das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e
relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as
circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade.
As testemunhas são ouvidas acerca dos fatos e possuem o dever de falar a verdade sobre o que
presenciaram, não podendo deixar de comparecer ao referido ato processual. Pela ordem processual
já citada, primeiro, são ouvidas as testemunhas de acusação e, posteriormente, as de defesa, em
obediência, mais uma vez, aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. As testemunhas são ouvidas acerca dos fatos e possuem o dever de falar a verdade sobre o que
presenciaram, não podendo deixar de comparecer ao referido ato processual. Pela ordem processual
já citada, primeiro, são ouvidas as testemunhas de acusação e, posteriormente, as de defesa, em
obediência, mais uma vez, aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
Os policiais militares podem ser ouvidos como testemunhas, uma vez que é natural do seu ofício
presenciarem a prática de crimes, todavia esse meio de prova não pode ser considerado absoluto,
como se todos os agentes públicos que participaram da prisão fossem pessoas de presumida boafé, devendo essa análise ser feita no caso concreto, conforme jurisprudência pacífica do Superior
Tribunal de Justiça, nesses termos:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO
IMPUGNADOS. SÚMULA 182/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. CONDENAÇÃO POR
TRÁFICO DE DROGAS E POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO.
SENTENÇA ABSOLUTÓRIA CASSADA PELO TRIBUNAL A QUO. AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. CONCESSÃO DE
HABEAS CORPUS DE OFÍCIO.
1. É inviável o agravo regimental que não infirma os fundamentos da decisão atacada.
Incidência da Súmula n. 182 do STJ.
2. Todavia, diante da ilegalidade do acórdão no que tange à condenação do réu,
impõe-se a concessão da ordem, ex officio, para restabelecer a sentença absolutória.
3. O entendimento firmado nesta Corte Superior é o de que “a revaloração dos
elementos fático-probatórios delineados pelas instâncias ordinárias não encontra
óbice na Súmula n. 7/STJ.” (AgRg no REsp 1.678.599/MG, Rel. Ministro ANTONIO
SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 7/11/2017, DJe 14/11/2017).
4. Conforme constou na sentença absolutória, de forma detalhada, não foi produzida
nenhuma prova robusta no sentido de que o réu, efetivamente, estaria exercendo o
tráfico de drogas, a não ser pelos depoimentos judiciais dos agentes policiais que
efetuaram a prisão em flagrante, considerados imprecisos pelo magistrado de 1º
grau, e que não foram adequadamente ponderados no acórdão recorrido, não
havendo, portanto, elementos seguros para fundamentar a condenação.
5. Como se depreende dos autos, os policiais receberam denúncias anônimas acerca
da ocorrência de tráfico de drogas, o que teria sido confirmado por meio de
“colaboradores anônimos da polícia”. Ocorre que, na residência do réu (primário e de
bons antecedentes), fora encontrada pequena quantidade de entorpecentes – 5,1 g
de cocaína e 3 g de maconha – além de 3 munições, tendo o agravante afirmado que
seria apenas usuário de drogas.
6. Com efeito, “O testemunho prestado em juízo pelo policial deve ser valorado,
assim como acontece com a prova testemunhal em geral, conforme critérios de coerência interna, coerência externa e sintonia com as demais provas dos
autos, não atendidos na hipótese.
Inteligência dos arts. 155 e 202 do CPP” (AREsp n. 1.936.393/RJ, relator Ministro
Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 8/11/2022.).
7. Assim, em consonância com o princípio in dubio pro reo, oriundo do art. 5º, em
vários dos seus incisos, da Constituição da República deve ser restabelecida a
sentença absolutória, com amparo no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.
8. Desse modo, não estando configurada a prática do crime de tráfico de
entorpecentes, imperioso o reconhecimento da atipicidade material da conduta,
relativa à posse de 03 munições de uso restrito, desacompanhadas do armamento
capaz de deflagrá-las, tendo em vista a ausência de lesão ou probabilidade de lesão
ao bem jurídico tutelado.
9. Agravo regimental desprovido. Concessão de habeas corpus, de ofício, para
cassar o acórdão recorrido, restabelecendo-se a sentença que absolveu o recorrente
da prática dos delitos previstos no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e no art. 16,
caput, da Lei n. 10.826/2003 (Processo n. 0006985-95.2016.8.21.0023).
Além disso, em situações de comprovada prática de crimes para obtenção das provas produzidas
em violação à legislação processual, ilicitude da prova é algo que se impõe e deve ser levada em
consideração para fins de julgamento, o que cai por terra a ideia da presunção de legitimidade dos
depoimentos prestados por policiais militares. Esta é a redação do art. 157 do CPP:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas
ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não
evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas
puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
A ilicitude das provas pode ser visualizada quando há a prática de um crime para fins de produção
de prova contra alguém, como pode acontecer nos crimes de tortura e abuso de autoridade, a seguir
mencionados:
Lei nº 9.455/97
Art. 1º Constitui crime de tortura:
I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe
sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira
pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de
violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de
aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena – reclusão, de dois a oito anos.
Lei nº 13.869/19
Art. 22. Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade
do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas
condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa
Em especial no crime de invasão de domicílio sem o consentimento do morador, mencionado na Lei
nº 13.869/19, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o militar deve
registrar, com vídeo e áudio, o aludido consentimento, sob pena de a prova obtida por esse meio não
ter validade, nesses termos:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO
CRIMINAL.TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. BUSCA DOMICILIAR
EFETUADA POR POLICIAIS MILITARES SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL.
FUNDADAS RAZÕES PARA REALIZAÇÃO DA BUSCA. INVERSÃO DA ORDEM
DO INTERROGATÓRIO. ART. 400 DO CPP. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte
Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus,
não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso
ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do
ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a
concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. (AgRg no HC 437.522/PR, Rel.
Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe
15/06/2018).
2. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado
em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do
dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões,
devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar
ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE n. 603.616/RO, Rel.
Ministro Gilmar Mendes) DJe 8/10/2010).
Nessa linha de raciocínio, o ingresso em moradia alheia depende, para sua validade
e sua regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem
para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer,
somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da
ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o
direito à inviolabilidade do domicílio.
Precedentes desta Corte
3. Em recente decisão, a Colenda Sexta Turma deste Tribunal proclamou, nos
autos do HC 598.051, da relatoria do Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ,
Sessão de 02/03/2021 (….) que os agentes policiais, caso precisem entrar em
uma residência para investigar a ocorrência de crime e não tenham mandado
judicial, devem registrar a autorização do morador em vídeo e
áudio, como forma de não deixar dúvidas sobre o seu consentimento. A
permissão para o ingresso dos policiais no imóvel também deve ser registrada,
sempre que possível, por escrito.
4. No caso concreto, a leitura do auto de prisão em flagrante revela que os Policiais
Militares que efetuaram a busca domiciliar, atuaram após terem presenciado o
paciente entregar algo para um menor que, ao ver a guarnição, arremessou uma
sacola o que motivou a realização da abordagem de ambos e a verificação do
conteúdo da sacola, ocasião em que se constatou que ela continha um
pedaço de substância similar a crack, tendo os policiais logrado identificar o
paciente como indivíduo que fora preso recentemente por porte
ilegal de arma de fogo além de porte de entorpecentes.
5. A constatação, em abordagem policial, de que o réu entregava entorpecentes a
menor constitui fundada razão para crer que na residência do acusado houvesse se
não outras drogas, pelo menos outras evidências do tráfico, tanto mais quando a tal constatação se alia a informação de que o mesmo acusado fora detido dias antes
com entorpecentes e uma arma de fogo.
6. Por ocasião do julgamento do HC n. 127.900/AM, ocorrido em 3/3/2016 (DJe
3/8/2016), o Pleno do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o rito
processual para o interrogatório, previsto no art. 400 do Código de Processo Penal,
deve ser aplicado a todos os procedimentos regidos por leis especiais. Isso porque a
Lei n. 11.719/2008 (que deu nova redação ao referido art. 400) prepondera sobre as
disposições em sentido contrário previstas em legislação especial, por se tratar de lei
posterior mais benéfica ao acusado.
7. Isso não obstante, esta Corte Superior já consolidou entendimento no
sentido de que, para se reconhecer nulidade pela inversão da
ordem de interrogatório, “é necessário que o inconformismo da Defesa tenha sido
manifestado tempestivamente, ou seja, na própria audiência em que realizado o ato,
sob pena de preclusão. Além disso, necessária a comprovação do prejuízo que o réu
teria sofrido com a citada inversão” (HC 446.528/SP, Rel. p/ acórdão Ministro FELIX
FISCHER, j. 11/9/2018, DJe 20/9/2018). Precedentes: RvCr 5.563/DF, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 12/05/2021,
DJe 21/05/2021; AgRg no REsp 1.846.930/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS,
QUINTA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 19/03/2021.
8. Não se identifica prejuízo derivado da realização de interrogatório antes da oitiva
das testemunhas de acusação se a leitura da sentença revela que, em sua oitiva, o
réu teve oportunidade de apresentar sua versão dos fatos, devidamente analisada
pelo magistrado, e que os depoimentos prestados por policiais em juízo apenas
referendaram narrativa já existente no Boletim de ocorrência e no Relatório
final de inquérito policial, documentos esses aos quais a defesa teve acesso antes
do interrogatório, não se podendo, assim, afirmar que o réu não teria tido
oportunidade de refutar, em seu interrogatório, as versões apresentadas
pelos policiais ouvidos em juízo.
9. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 2022620 / AC)No mesmo sentido narrado, a prova obtida pelos militares sem que tenha havido o consentimento do
morador para ingressar em seu domicílio macula de nulidade o processo penal, não podendo ser
levada em consideração por parte do Poder Judiciário, nesses termos:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL.
LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (140 G DE MACONHA E
19,5 G DE COCAÍNA). NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA
ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. DENÚNCIA ANÔNIMA.
MANIFESTA ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. CARÊNCIA DE
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, BEM COMO DE CONSENTIMENTO VÁLIDO DO
MORADOR. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.
1. Na exordial acusatória consta que a Polícia Federal várias vezes obteve
informação de que o denunciado Valdo Lima da Silva vendia drogas em sua casa.
No dia dos fatos, após receberem denúncia anônima de que o denunciado estava
vendendo cocaína, policiais federais o abordaram em frente à sua residência e
encontraram com ele a quantia de R$ 1.172,00, fracionados em 87 cédulas, bem
como, passaram a fazer buscas no quintal e interior da casa, encontrando 16,29 g de
pasta-base de cocaína e 4,25 g de cocaína envolvidas em pequenos invólucros
plásticos (fl. 60).
2. Extraem-se do combatido aresto razões colacionadas para a
condenação do agravado: a prova obtida na casa onde ocorria a prática de crime
permanente – tráfico de drogas – é lícita, pois coloca o agente em constante estado
de flagrância, afastando assim a necessidade de mandado judicial para uma eventual
ação policial, conforme disposto no artigo 302, inciso I, do Código de Processo Penal.
[…] Aliado a isso, verifico que na fase inquisitória o sobrinho da ex-companheira do apelante – José Emerson Lima da Silva -, declarou que se
encontrava na residência no momento da chegada dos policiais e franqueou a
entrada dos mesmos. […] Assim, tratando-se de crime permanente,
hipótese dos autos, não é necessária a expedição de mandado de busca e
apreensão, sendo lícito à autoridade policial ingressar no interior do domicílio.
Portanto, não há ilegalidade na diligência realizada no domicílio da excompanheira do apelante (fls. 221/223).
3. Consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal, a notícia anônima de
crime, por si só, não é apta para instaurar inquérito policial; ela pode servir de base
válida à investigação e à persecução criminal, desde que haja prévia verificação de
sua credibilidade em apurações preliminares, ou seja, desde que haja investigações
prévias para verificar a verossimilhança da noticia criminis anônima. Assim, com
muito mais razão, não há como se admitir que denúncia anônima seja elemento
válido para violar franquias constitucionais (à liberdade, ao domicílio, à intimidade).
4. […] a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no
sentido de que “[…] a prova da legalidade e da voluntariedade do
consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de
dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que
autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível,
testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudiovídeo e preservada tal prova enquanto durar o processo […]” (HC n. 608.405/PE,
Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 6/4/2021,
DJe 14/4/2021). […] Como não ficou devidamente comprovada a
legalidade do acesso direto dos agentes policiais na residência do Acusado,
não há outro caminho senão reconhecer a nulidade das provas obtidas por este
meio de prova. […] Tal nulidade, ocorrida ainda no início da fase investigatória,
contaminou todas as demais provas produzidas, que são delas derivadas,
impondo-se a anulação integral do processo e absolvição do Agravado, nos
termos do art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal, pela ausência de
provas válidas da existência do fato. (AgRg no AREsp n. 1.842.493/AM, Ministra
Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 31/8/2022). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg
no REsp 2022620 / AC)
O que se percebe pela jurisprudência citada é que a prova é eivada de nulidade, desde a fase
investigatória, contaminando todas as provas produzidas posteriormente, na forma do art. 157, § 1º,
do CPP, in verbis:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas
ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não
evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas
puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
Caso não tenha nenhuma outra prova hábil a condenar o acusado, a impronúncia é medida que se
impõe, na forma do art. 414 do CPP.
Quanto à prova pericial, trata-se de meio admitido também no Código de Processo Penal, devendo
ser bem observado que há uma certa taxatividade para a sua realização nos crimes que deixam
vestígios (delitos não transeuntes), não sendo possível outro meio substitutivo de prova, o que torna
imprescindível a sua realização, nesses termos: “Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do
acusado”
Os crimes de homicídio, porte ou posse de arma de fogo e tráfico de drogas necessitam de exame
pericial, pois são delitos que deixam vestígios e necessitam de ter a materialidade atestada. O
suprimento do exame pericial, no crime de homicídio, pode até ser feito por outros meios de prova
lícitos, o que não ocorre quando policiais militares praticaram delitos (tortura e abuso de autoridade)
para a obtenção de provas contra o acusado, na forma da jurisprudência mencionada a seguir:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
PROVA INDIRETA DA MATERIALIDADE DOS DELITOS. ARTS. 158 E 167 DO
CPP. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 41 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA.
MATERIALIDADE E AUTORIA. DESCONSTITUIÇÃO DO LIVRE
CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO
PROBATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. A ausência de exame de corpo de delito no crime de homicídio não constitui,
necessariamente, nulidade, podendo a prova da materialidade da conduta ser
suprida, tanto de forma direta quanto indireta, com base no conjunto probatório, o
que atende aos pressupostos do art. 41 do CPP.
2. A desconstituição da formação do livre convencimento motivado a respeito da
presença da justa causa para ação penal, em especial quanto aos indícios de autoria
e materialidade apresentados pelo órgão ministerial no momento do oferecimento da
denúncia, demanda necessária dilação probatória, procedimento vedado na estreita
via do habeas corpus.
3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 661479 / PA).
Na mesma linha de pensamento, os crimes de posse ou porte de arma de fogo e tráfico de drogas
necessitam de perícia para fins de ter validade a prova produzida, conforme se depreende do
conteúdo do Superior Tribunal de Justiça mencionado a seguir, nesses termos:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS
CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AUSÊNCIA
DE LAUDO PERICIAL DA DROGA APREENDIDA. NÃO OCORRÊNCIA.
MATERIALIDADE DELITIVA. ALTERAÇÃO DO JULGADO. INVIABILIDADE.
AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A jurisprudência do STJ estabelece que, para a condenação por tráfico de
drogas, é necessário comprovar a materialidade do delito com a apreensão da droga
e a elaboração de laudo pericial. A ausência desse laudo impossibilita a
comprovação da materialidade e resulta na absolvição do réu por falta de provas (HC
n. 686.312/MS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, relator para acórdão Ministro
Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 19/4/2023).
2. Destaca-se que a apreensão da droga pode ocorrer com o acusado ou qualquer
um dos corréus, desde que demonstre a sua ligação com a organização criminosa.
Nesse sentido, a jurisprudência do STJ reconhece que a falta de apreensão direta
com o agente não afasta a materialidade do tráfico quando há evidências da sua
relação com outros membros da organização criminosa responsáveis pela guarda das drogas (HC n. 536.222/SC, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma,
DJe de 4/8/2020).
3. No presente caso, constatou-se a realização de perícia nas drogas apreendidas,
mesmo que relacionadas aos corréus, o que invalida a alegação absolutória
pretendida. A alteração do julgado demandaria um indevido reexame do conjunto
fático-probatório, o que não é permitido nessa via estreita.
4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 812752 / PE)AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ARTS. 12 E 16 DA
LEI N. 10.826/2006. TRANCAMENTO DA PERSECUÇÃO PENAL. ALEGADA
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA POR
OBSOLESCÊNCIA DOS ARTEFATOS APREENDIDOS. INOCORRÊNCIA.
POTENCIALIDADE LESIVA ATESTADA POR LAUDOS PERICIAIS.
DELITOS DE PERIGO ABSTRATO QUE PRESCINDEM DE EFETIVO RISCO À
PAZ PÚBLICA. PRECEDENTES. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL EM HABEAS
CORPUS É MEDIDA EXCEPCIONAL. NECESSIDADE DE ANÁLISE
APROFUNDADA DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA
VIA PROCESSUAL ELEITA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO.
– Consolidou-se, nesta Superior Corte de Justiça, entendimento no sentido de que
somente é cabível o trancamento da persecução penal por meio do habeas corpus
quando houver comprovação, de plano, da ausência de justa causa, seja em razão
da atipicidade da conduta praticada pelo acusado, seja pela
ausência de indícios de autoria e materialidade delitiva, ou, ainda, pela
incidência de causa de extinção da punibilidade. Precedentes
– Havendo a potencialidade lesiva da arma de fogo e das munições sido atestadas
pelos laudos periciais, não há que se falar em ausência de justa causa para o
prosseguimento da persecução penal, pois se tratam de delitos de perigo abstrato,
os quais prescindem de efetivo risco à paz pública. Por tais razões, a Quinta Turma
desta Corte consolidou o entendimento segundo o qual o porte de munição, ou
mesmo de arma de fogo desmuniciada, subsumem-se aos tipos penais previstos na
Lei n. 10.826/2006. Precedentes
– Desse modo, não sendo possível atestar de plano a atipicidade das condutas
atribuídas ao paciente, impossível concluir-se pela inexistência de justa causa para
a persecução criminal, pois, para se negar a ocorrência dos fatos delituosos, seria
necessária a análise aprofundada de matéria fático-probatória, o que é vedado na via
estreita do habeas corpus.
– Agravo regimental não provido. (AgRg no HC 741264 / SP).
Os demais pormenores da prova pericial estão tratados nos arts. 159 e 160, in verbis:
Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito
oficial, portador de diploma de curso superior
§ 1º Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas,
portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre
as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.
§ 2º Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente
desempenhar o encargo
§ 3º Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido,
ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de assistente
técnico.
§ 4º O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão
dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas
desta decisão.
§ 5º Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à
perícia:
I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a
quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem
esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias,
podendo apresentar as respostas em laudo complementar;
II – indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser
fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência
§ 6º Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à
perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua
guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for
impossível a sua conservação.
§ 7º Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de
conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito
oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico
Art. 160. Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o
que examinarem, e responderão aos quesitos formulados.
Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo máximo de 10 dias,
podendo este prazo ser prorrogado, em casos excepcionais, a requerimento dos
peritos.
Importante destacar que a ausência do exame de corpo de delito é, inclusive, caso de nulidade
processual, conforme se destaca do art. 564, III, b), do CPP, nesses termos:
Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
(…)
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
(…)
b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto
no Art. 167;
Dessa forma, como não há prova lícita ou válida para a condenação, importante mencionar o disposto
no art. 414 do CPP, que determina a impronúncia em tais situações.
DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO E ERRO NA EXECUÇÃO
O princípio da consunção ou absorção impõe que o acusado deve responder apenas por um crime,
qual seja, o crime-fim, restando absorvido o crime-meio necessário para chegar-se ao delito final.
Por exemplo, caso alguém se valha de uma arma de fogo para realizar um crime de homicídio, os
crimes de posse e porte de arma de fogo anteriormente praticados para a consecução daquele crime
devem ser absorvidos, diferentemente do que ocorre no concurso material de crimes, previsto no art.
69 do CP, em que todos os crimes são aplicados e as respectivas penas somadas.
Em outras palavras, em vez de o agente responder por vários crimes com as penas somadas, haverá
a punição apenas pelo crime-fim, restando os demais crimes absorvidos e sem qualquer punição.
Além disso, deve ser lembrado que, no presente caso, ocorreu a hipótese de erro na execução
prevista no art. 73 do CP, que tem a seguinte redação:
Erro na execução
Art. 73 – Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao
invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde
como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º
do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente
pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.
Quando o agente queria atingir apenas uma pessoa, mas atinge ambas, tem-se a regra do art. 70 do
CP, que é citada na parte final do art. 73. Por tal regra, ocorre aquilo que se chama de concurso
formal próprio, em que o agente responde apenas pelo crime mais grave com a pena exasperada,
sem que haja a soma delas. Por exemplo, se cometeu um homicídio que almejava e a outra morte
não foi desejada, responderá por um crime de homicídio com a pena aumentada, em vez de somar
dois homicídios.
Essa é a dicção do art. 70, 1ª parte, do CP, nesses termos:
Art. 70 – Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais
crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais,
somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.
As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e
os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no
artigo anterior
Parágrafo único – Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art.
69 deste Código.
Caso o agente quisesse os dois homicídios, então teria o concurso formal impróprio da 2ª parte do
art. 70 do CP, em que as penas seriam somadas, mas isso somente se houvesse dolo de matar as
duas vítimas.
Quanto aos prazos processuais penais, cita-se o Código de Processo Penal com a orientação de
excluir-se o dia do início (intimação, por exemplo) e incluir o dia final, lembrando que prazos
processuais penais não se iniciam em dias não úteis e não se encerram nesses mesmos dias, na
forma do disposto a seguir:
Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios,
não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.
§ 1º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do
vencimento.
§ 2º A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém,
considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do
dia em que começou a correr
§ 3º O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até
o dia útil imediato.
Logo, deve ser dada atenção à contagem dos prazos processuais, em que o início se dará em dia
útil e o dia final também.
Um detalhe final é que, nos crimes dolosos contra a vida, como ocorre com o homicídio, a
competência para julgar todos os delitos conexos é do Tribunal do Júri, daí sendo relevante direcionar
a peça processual para esse juízo específico, na forma do art. 78, I, do CPP.
PONTO DE ATENÇÃO
A produção de prova em audiência de instrução e julgamento é de fundamental
importância, pois o destino do acusado é selado nesse relevante momento
processual, o que demanda uma atenção especial para a temática das provas
no Processo Penal.